Na Bahia, mais de 12 mil crianças foram registradas sem o nome do pai em 2020

Entre janeiro e dezembro de 2020, 6,6% das crianças registradas na Bahia tiveram a Certidão de Nascimento emitida apenas com o nome da mãe. A porcentagem corresponde a 12.064, em um universo de 181.135 crianças nascidas vivas, que desconhecem sua origem paterna. Os dados são da Associação Nacional dos Registradores Civis de Pessoas Naturais do Estado da Bahia (Arpen-BA), compilados a pedido do Bahia Notícias. 


Na última semana, ao discutir os desdobramento do caso da mãe que abandonou a filha recém-nascida em um banheiro do terminal de ônibus Acesso Norte, em Salvador, a advogada Mariana Regis, especializada em Direito das Famílias com perspectiva de gênero, pontuou aspectos sociais conjunturais que dão conta da ideia de “naturalização da irresponsabilidade paterna”, termo recorrente nos debates pautados por movimentos sociais de pautas feministas e de enfrentamento ao machismo (reveja).  

“A verdade é que se trata de uma conduta violenta que causa graves danos não somente aos filhos e filhas, mas às mães.  ‘Quem pariu Mateus que balance’, diz o dito popular”, reflete.

“Temos uma cultura de abandono paterno e uma cultura de exploração e violência contra mulheres. Casos como esse refletem essa cultura e são oportunidades para a gente refletir o que a maternidade representa para uma mulher. A construção desta maternidade é extremamente opressora, pois o abandono e irresponsabilidade paterna são naturalizadas socialmente, então o que resta para uma mãe? Arcar com toda carga de gestar e trazer um filho ao mundo. Com todas as perdas e renúncias. Para o homem, sempre o privilégio, o direito de escolher se vai ser pai, como e quando exercerá essa paternidade”, acrescenta.

Desde 2016, quando entrou em vigor a Lei 13.577, os Cartórios de Registro Civil de Pessoa Natural foram obrigados a notificar, mensalmente, a Defensoria Pública dos Estados todos os casos de crianças registradas sem o nome do pai. A notificação é realizada para que todas as medidas cabíveis possam ser adotadas, a fim de incluir a paternidade no registro da criança. 

No caso da Bahia, quando ocorre a notificação da ausência do pai, Defensoria Pública entra em contato com as mães para disponibilizar os seus serviços, seja para a conscientização sobre o reconhecimento voluntário da paternidade, seja através do oferecimento de exames de DNA a serem custeados pela própria Defensoria.

“A Defensoria expede uma carta-convite, que é entregue pela mãe da criança ao suposto pai, para realização de uma audiência extrajudicial. Caso ambas as partes concordem, serão direcionadas para o laboratório, para a realização do exame de DNA. Quando o resultado do exame de DNA é positivo, a instituição encaminha um ofício ao cartório para averbar a paternidade e, daí, realizar a regulamentação de pensão alimentícia, do direito de convivência, de guarda e de todas as questões decorrentes da paternidade”, explica Analeide Leite de Oliveira Accioly, coordenadora da especializada de Família e Sucessões da Defensoria Pública baiana.

Ela ainda acrescenta que, na hipótese de o suposto pai vir a falecer, é realizada a investigação de paternidade post mortem. Neste caso, o exame de DNA é realizado com parentes do suposto pai que faleceu e após ajuizar a necessária ação de investigação da paternidade post mortem, pois não tem como averbar a paternidade nesse caso sem uma ordem judicial.

“É importante destacar que toda criança e adolescente têm o direito de ter a paternidade reconhecida. Na hipótese da pessoa atingir a maioridade e não obtiver o registro civil com o nome do suposto genitor, a própria pessoa poderá, por sua própria vontade, buscar o reconhecimento da paternidade através da Defensoria Pública da mesma forma acima descrita para a genitora, quando ainda eram menores de idade”, enfatiza Accioly. 


RECONHECIMENTO TARDIO DE PATERNIDADE

A Arpen-BA também reforça que a norma nacional da CNJ desburocratizou o reconhecimento tardio espontâneo de paternidade. A partir dela fica permitida que, nos casos em que há a concordância do pai, o procedimento seja realizado gratuitamente em qualquer Cartório de Registro Civil sem a necessidade de procedimento judicial e a contratação de advogado. Em caso de não concordância, a mãe poderá fazer a indicação do suposto pai, para ser iniciado um procedimento de investigação.

Para que todo o procedimento seja realizado no cartório, o pai deve concordar ou requerer o reconhecimento de paternidade tardio de forma espontânea. A mãe deverá acompanhar a manifestação desta informação, caso o filho seja menor de idade. Os pais deverão estar com seus documentos pessoais e a certidão de nascimento original do filho que será reconhecido.

Caso o filho já tenha atingido a maioridade, pai e filho deverão comparecer ao cartório, munidos de seus documentos pessoais e originais, certidão de nascimento original do registrado, comprovantes de residência e certidões dos distribuidores forenses (da Justiça Estadual – distribuição criminal execuções criminais; da Justiça Federal – distribuição cível e criminal e execuções criminais; certidão de protesto no Cartório de Protesto e antecedentes criminais).

O reconhecimento de paternidade é um ato irrevogável salvo em casos de inequívoca comprovação de que o reconhecedor foi induzido a erro (exame de DNA, testemunhas, documentos etc.). Com o ato feito, poderá ser adotado o sobrenome do pai, mas nunca a retirada do sobrenome da mãe.

(Fonte: Site Bahia Notícias, por Mari Leal – 08/06/21)

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